O
Código de Processo Civil entrou em vigor em 18 de março de 2016, mas ainda é
salutar tecer algumas considerações sobre o cumprimento de sentença referente à
obrigação de alimentos, que se fundamenta no princípio da solidariedade
familiar, estando previsto no artigo 229 da Constituição Federal de 1988 que
“os pais têm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou
enfermidade”.
Inicialmente,
é relevante anotar que os artigos 513 a 519 do Estatuto Processual disciplinam
as disposições gerais que devem ser aplicadas nos incidentes de cumprimento de
sentença ou de decisão, tais quais o modo de intimação do devedor, as espécies
de títulos executivos judiciais e a competência do juízo, dentre outras.
Quanto
à competência, restou estatuído pelo artigo 516, inciso II, do Código de
Processo Civil que o cumprimento de obrigação de alimentos se dará no juízo que
decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição ou no juízo do atual domicílio
do credor (artigo 528, parágrafo 9º).
Especificamente,
a execução da obrigação de alimentos, provisória ou definitiva, se dará, na
forma do artigo 528, em fase de cumprimento de sentença quando se tratar de
título judicial. Abrem-se aí duas possibilidades: a) seguimento pelo
procedimento que autoriza a prisão civil; b) ou pelo procedimento mediante
penhora de bens.
No
primeiro caso, o prazo, após intimação do devedor, será de três dias para pagar
ou provar a impossibilidade, sob pena de prisão de um a três meses, além de o
juiz mandar protestar o pronunciamento judicial (parágrafos 1º e 3º do referido
artigo). Restou normatizado o entendimento (da Súmula 309 do STJ) de que o
débito alimentar que autoriza a prisão civil é o que compreende até as três
prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso do
processo (parágrafo 7º do artigo 528).
Dispõe
o artigo 531, parágrafo 1º que a execução dos alimentos provisórios, bem como a
dos alimentos fixados em sentença ainda não transitada em julgado, se dará em
autos apartados, ao passo que o cumprimento definitivo da obrigação de prestar
alimentos será processado nos mesmos autos em que tenha sido proferida a
sentença (parágrafo 2º). Todavia, o Tribunal de Justiça de São Paulo
convencionou que, quer se trate de autos físicos, quer digitais, deverá a parte
interessada ajuizar pedido apartado em meio eletrônico, com numeração própria,
instruindo-o com as peças processuais necessárias, quais sejam, título
executivo, demonstrativo do débito, documento das partes e procuração (Prov. CG
16/2016, Comunicado CG 438/2016 e Comunicado Conjunto CG 464/2016).
Exige-se
a intimação pessoal do devedor, não se aplicando, portanto, as regras previstas
nas disposições gerais que permitem a intimação na pessoa do advogado ou por
meio eletrônico. Tal se deve em razão das graves implicações decorrentes do
inadimplemento do devedor, que poderá ter sua prisão civil decretada. Em última
hipótese, sua intimação poderá se dar por carta com aviso de recebimento no
mesmo endereço dos autos.
Em
se tratando de decisão proferida em sede de tutela de urgência, dispensável a
intimação pessoal do devedor se este tiver procurador constituído nos autos,
porquanto o processo onde fora instituída a obrigação ainda se acha em
andamento.
Uma
vez intimado, o devedor deverá justificar o inadimplemento mediante a
comprovação de fato que tenha gerado a impossibilidade absoluta de pagar, caso
contrário terá, como já visto, a prisão civil decretada pelo prazo de um a três
meses. Não basta, portanto, a alegação genérica de que se acha sem condições de
pagar o débito, sendo seu ônus a prova de fato inequívoco que o tenha
impossibilitado.
Ainda
em caso de descumprimento, poderá o pronunciamento judicial ser levado a
protesto (artigo 528, parágrafo 1º), ou ainda o devedor poderá ter seu nome
inscrito no cadastro de proteção ao crédito (artigo 782, parágrafos 3º e 5º). O
cumprimento da pena imposta não eximirá o devedor, por óbvio, do pagamento das
prestações alimentícias vencidas e vincendas (artigo 528, parágrafo 5º).
Na
hipótese "b" antes referida, em se tratando de débito superior a três
prestações, não será admissível a prisão civil (artigo 528, parágrafo 8º),
devendo a execução se dar na forma do artigo 523 (obrigação de pagar quantia
certa), fazendo-se a intimação do executado para pagar o débito em 15 dias,
acrescido de multa e honorários de 10% se não ocorrer o pagamento voluntário, sob
pena de penhora de bens (parágrafo 3º).
De
outro modo, ajuizado o cumprimento de sentença sob o rito da prisão civil, não
incidirá o acréscimo da multa prevista no artigo 523, porquanto descabida dupla
sanção. Nada impede, contudo, que no decorrer do processo o credor requeira,
caso não ocorra o cumprimento da obrigação, a conversão do rito para o
procedimento de penhora de bens (artigo 530).
Não
se tem admitido o seguimento da execução mediante a cumulação simultânea desses
dois procedimentos em único processo, ou seja, sob pena de prisão civil e
também penhora de bens, por incompatibilidade de ritos (Agravo de Instrumento
2026620-59.2016.8.26.0000, TJ-SP). Assim, caso o débito alimentar seja superior
a três parcelas, caberá ao credor optar por um ou outro procedimento ou, em
última hipótese, poderá ingressar com dois pedidos autônomos de cumprimento de
sentença, cada qual sob o procedimento adequado, em dois processos distintos,
sem necessidade de apensamento, mas perante o mesmo juízo. Também já se decidiu
que a opção pelo rito adotado é do credor (Agravo de Instrumento
2190996-28.2017.8.26.0000, TJ-SP).
Tendo
o credor optado pelo rito da penhora de bens (artigo 528, parágrafo 8º c.c.
artigo 523), e decorrido o prazo para cumprimento pelo devedor, a multa
incidirá sobre a totalidade do débito. Caso tenha ocorrido o pagamento parcial,
a multa e os honorários incidirão sobre o restante (artigo 523, parágrafo 2º).
Em seguida, será expedido mandado de penhora e avaliação, que poderá ter seu
cumprimento mediante bloqueio on-line da conta bancária do devedor.
Independentemente
de penhora, uma vez transcorrido o prazo de 15 dias sem o pagamento voluntário,
inicia-se automaticamente novo prazo de 15 dias para o devedor apresentar nos
autos sua impugnação, onde poderá alegar exclusivamente as matérias elencadas
no artigo 525, parágrafo 1º, tais como falta ou nulidade de citação no processo
de conhecimento, ilegitimidade, inexigibilidade da obrigação ou
inexequibilidade do título, penhora ou avaliação incorreta, excesso de
execução, incompetência ou qualquer causa modificativa ou extintiva da
obrigação.
Caso
alegue excesso de execução, o devedor deverá apresentar o valor que entende
adequado acompanhado do respectivo demonstrativo de cálculo, sob pena de não conhecimento
da alegação (artigo 525, parágrafo 5º). É importante observar que a impugnação
do devedor poderá ser apresentada sem prévia garantia do juízo (Agravo de
Instrumento 2061048-67.2016.8.26.0000, TJ-SP).
Presentes
os requisitos legais, o juiz poderá, após a impugnação, conceder-lhe efeito
suspensivo (artigo 525, parágrafo 6º), sem prejuízo dos atos de substituição,
reforço, redução da penhora ou avaliação dos bens.
O
devedor poderá, antes de ser intimado para o cumprimento da sentença,
comparecer em juízo e oferecer em pagamento o valor que entender devido (artigo
526), podendo o credor impugnar o valor depositado. Se constatada a
insuficiência do valor, o juiz determinará o prosseguimento da execução com
penhora e atos subsequentes. Ou declarará satisfeita a obrigação caso o credor
não se opuser ao valor depositado.
Restou
também disciplinado que, sem prejuízo dos alimentos vincendos, poderá o juiz
mandar descontar das rendas do devedor, de forma parcelada, o débito apurado,
desde que, somado à prestação mensal devida, não ultrapasse 50% de seus ganhos
líquidos (parágrafo 3º do artigo 529). Outrossim, o parcelamento do débito
depende da concordância do credor, pois constitui faculdade deste (Agravo de
Instrumento 2075135- 91.2017.8.26.0000, TJ-SP).
Por
outro lado, a execução dos alimentos fundada em título extrajudicial (artigo
911) está inserida no Título II, do Livro II, referente às diversas espécies de
execuções. Por não haver sentença ou decisão judicial que a instituiu, a
obrigação será exigida em procedimento específico de execução de título
extrajudicial. O executado, desta feita, será citado, e não meramente intimado,
para em três dias efetuar o pagamento das parcelas anteriores e das que se
vencerem no curso da ação, podendo provar que o fez ou justificar a
impossibilidade de fazê-lo, aplicando-se, no que couber, o disposto nos
parágrafos 2º a 7º do artigo 528, ou seja, a execução poderá ser promovida sob
pena de prisão civil.
Também
será possível que a execução se dê na forma do artigo 824 e seguintes (execução
por quantia certa mediante a expropriação de bens do executado). Nessa
hipótese, a defesa do devedor poderá se dar mediante apresentação de embargos à
execução (artigo 914), constituindo título executivo extrajudicial o
instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria
Pública e pela Advocacia Pública (artigo 784, IV), dentre outros.
Portanto,
constata-se que o atual estatuto processual civil inovou e trouxe diversos
instrumentos visando à concretização da obrigação alimentar,
constitucionalmente imposta no artigo 229 da Constituição Republicana de 1988,
o que concretiza os princípios básicos dos deveres inerentes ao poder familiar
e ao princípio da solidariedade.
Rogério Alvarez de
Oliveira é promotor de Justiça e integrante do Movimento do Ministério Público
Democrático.
Revista
Consultor Jurídico
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