1.
A chancela do Decreto nº 9.288/2018, na sexta-feira da semana do Carnaval, inaugura
mais um episódio da ruptura democrática parlamentar iniciada em 2016.
Pelo
referido decreto presidencial, um general do Exército brasileiro passará a
comandar “paralelamente” o governo do Estado do Rio de Janeiro na área da
“segurança pública”.
2.
Trata-se da primeira medida dessa natureza decretada na história republicana
após o fim da recente ditadura militar e sob a égide da Constituição de 1988,
que neste ano completa seus brevíssimos 30 anos.
3.
O decreto encontra-se eivado de inconstitucionalidades e não apenas pelo
desatendimento da prévia oitiva do Conselho da República e do Conselho de
Defesa Nacional, conforme determinam os artigos 90 e 91 da Constituição Cidadã.
4.
A intervenção não se fundamenta nas hipóteses previstas no artigo 34 da
Constituição da República, pois dentre as condições autorizativas de
intervenção federal não consta a expressão “segurança pública”, de imprecisão
conceitual e de inspiração autoritária.
5.
O mencionado Decreto nº. 9.288/2018 nem sequer faz referência ao dispositivo
constitucional; apenas ao capítulo e título no qual se inserem os incisos nos
quais deveria fundamentar a intervenção. A justificativa, que não se confunde
com fundamentação, faz rasa referência ao “grave comprometimento da ordem
pública”, dizendo que “se limita à área de segurança pública” com o objetivo de
“pôr termo a grave comprometimento da ordem pública no Estado do Rio de
Janeiro”.
6.
Na verdade, tenta-se por exercício retórico burlar a Constituição ao se
empregar o termo “segurança pública” no sentido do termo constitucional “ordem
pública”, quando inexistente qualquer conflagração generalizada que justifique
tal medida.
7.
A natureza militar da intervenção, mal disfarçada no parágrafo único do art. 2º
do decreto, além de inconstitucional, remete aos piores períodos da História
brasileira, afrontado a democracia e o Estado de Direito.
8.
A intervenção ora decretada, tenha o real motivo que tiver, é uma medida
autoritária, de ruptura definitiva com o cambaleante Estado Democrático de Direito
e semelhante recurso longe de resolver os problemas da "segurança
pública", pois jamais enfrentadas as causas estruturais da crise, somente
servirá para massacrar as populações da periferia equivocadamente reconhecidas
pela classe média e pela mídia local como o "inimigo".
9.
Caso se continue a atacar as consequências e ignorar as causas da violência
social, apenas se consagrará a irracionalidade da “ação pela ação”, com o
emprego de recursos antidemocráticos por um governo de legitimidade discutível.
10.
Assim, a AJD pugna pela imediata suspensão do Decreto inconstitucional, pela
sua rejeição pelo Congresso Nacional, bem como que os membros do Poder
Judiciário realizem uma profunda reflexão neste momento em que, mais uma vez, o
sistema de justiça não está vigilante quanto ao respeito ao Estado Democrático
de Direito, como tantas vezes aconteceu em diversos períodos da história da
República Federativa do Brasil.
http://www.contextolivre.com.br/2018/02/nota-da-associacao-juizes-para.html
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