A
atividade parlamentar soberana ainda é a que distingue uma democracia de
regimes autoritários. A ninguém passou desapercebido, por outro lado, o quanto
nos últimos anos muitos dos atores do legislativo desonraram o mandato popular,
seja por se venderem por trinta pratas a um governo golpista, seja por
transformarem sua nobre arena num picadeiro de circo, mais preocupados em fazer
coro com o discurso de ódio barato que foi disseminado pela mídia, do que
representar os interesses de seus constituintes.
Desconstruíram
direitos, consagraram a entrega de ativos estratégicos nacionais e permitiram a
venda irrestrita de terras do sagrado solo brasileiro ao capital estrangeiro.
Tornou-se, o Congresso Nacional, majoritariamente, um amontoado de aventureiros
sem eira nem beira, que há muito deixou de representar a sociedade.
A
política nacional se encontra numa de suas mais graves crises da história do
país. Mas, seguramente, a culpa por esse estado de coisas não é só do
parlamento. O oportunismo corporativo de carreiras de estado que lidam com a repressão
se aproveitaram do vazio deixado por um parlamento incapaz de exercer a
soberania popular eficiente e eticamente, para se colocarem no centro do debate
político.
Abandonaram
também sua missão para desrespeitar garantias fundamentais num processo de
lustração coletiva realizado por entrevistas, campanhas midiáticas e discurso
moralista oco, direcionado apenas para reforçar a própria posição no quadro
constitucional.
O
Ministério Público Federal, em especial, carrega enorme responsabilidade pelo
esgarçamento do tecido institucional do estado brasileiro. Dirigido por quatro
anos por um procurador-geral despreparado e de pequena estatura moral, investiu
não contra “corruptos”, mas contra os demais poderes, ao se utilizar da
balbúrdia como método de trabalho.
Fez
seus chefiados (sim, segundo o art. 128 da Constituição, o PGR é “chefe” do
Ministério Público da União!) correrem soltos, por um lado porque não sabia
fazer seu dever de casa na seara criminal; por outro, porque queria jogar para
a plateia como forma de se legitimar internamente, já que não tinha autoridade
pessoal. Projetou, com isso, o MPF para a pior fase em sua trajetória pós-1988.
Nunca a instituição de deformou e se degradou tanto.
A
sociedade que depositara tanta esperança no ministério público como entidade
destinada a defender direitos coletivos e interesses difusos, deve se sentir,
hoje, frustrada, sentada sobre os escombros daquilo que outrora foi a jóia da
governança democrática desenhada na Constituinte.
Sofrendo
de total aporia social, a instituição ficou infestada do ranço corporativista,
dominada por gente vaidosa que só olha para o próprio umbigo. Desmereceu o
destaque que lhe conferiram no texto constitucional. Revelou-se um risco para a
democracia e o Estado de Direito.
A
atuação do ministério público deixou de ser pedagógica para os demais poderes
do Estado. Com o punitivismo barato se entregou ao populismo e à demagogia,
pouco se interessando em dar sua colaboração para a superação de
vulnerabilidades da governança nacional. Jogou com golpistas quando lhe foi
conveniente e atracou-se com estes quando o chefe do bando do golpe não quis
atender a suas pretensões de hegemonia política. Enfiou os pés pelas mãos.
Ao
declarar guerra aos golpistas, para forçá-los a se submeterem ao projeto de
poder do procurador-geral anão, o ministério público aceitou ser vidraça. Usou
a infame estratégia da delação premiada para plantar estórias mal contadas
sobre pessoas que o PGR elegeu seus inimigos.
Permitiu
vazamento do teor das delações e de ilegal gravações de forma calculada,
contando com a leniência do STF. E houve quem, na liderança do MPF, achasse que
derrubaria o golpista-mor com a mesma facilidade com que ajudou a derrubar uma
presidenta honesta eleita por 54 milhões de brasileiras e brasileiros.
Quebrou
a cara.
A
CPMI da JBS que foi instalada na sequência da desastrada tentativa de subverter
a ordem constitucional, ainda que levada a efeito por um parlamento
enfraquecido pelas péssimas práticas patrimonialistas e anti-povo, é de
interesse da sociedade. Sim, é uma CPI para investigar e por a nu a lambança
promovida pelo ex-PGR na chefia no MPF.
E
o que tem isso de errado? Se o MPF se deu ao direito de agir politicamente, de
se colocar no centro do debate político, politicamente deve ser tratado.
Colocar luz nas más e desviadas práticas do ministério público que tanto
prejuízo trouxe ao país é mais do que legítimo. É um imperativo de se
restabelecer minimamente o equilíbrio entre os poderes e recuperar a autoridade
da instituição pela correção de suas graves mazelas e expiação de seus pecados.
Sim, uma CPMI do Ministério Público é mais do que bem-vinda.
http://www.diariodocentrodomundo.com.br/uma-cpmi-do-ministerio-publico-e-mais-do-que-bem-vinda-por-eugenio-aragao/
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